Embrapa Semiárido
Sistemas de Produção, 1 – 2a. edição
ISSN 1807-0027 Versão Eletrônica
Agosto/2010
Cultivo da Videira
Vanderlise Giongo Petrere
Tony Jarbas Ferreira Cunha

Sumário

Apresentação
Caracterização social e econômica da cultura da videira
Aspectos agrometeorológicos da cultura da videira
Manejo e conservação do solo
Mecanização
Nutrição, calagem e adubação
Cultivares
Produção de mudas de videira
Implantação do vinhedo
Irrigação e fertirrigação
Manejo da parte aérea
Manejo de cachos e reguladores de crescimento
Doenças
Pragas
Normas gerais sobre o uso de agrotóxicos
Colheita e pós-colheita
Comercialização, custos e rentabilidade Referências
Glossário
Expediente

Manejo e conservação do solo

 

Características dos solos cultivados com videira no Submédio do Vale do São Francisco
Conservação do solo
Nutrição e Adubação verde
Aplicação de compostos orgânicos e biofertilizantes

 

O manejo, a proteção e uso do solo devem-se basear, primeiramente, no seu potencial produtivo. Sendo que para um manejo adequado do solo é necessário considerar suas propriedades físicas (aeração, retenção de água, compactação, estruturação), químicas (reação do solo, disponibilidade de nutrientes, interações entre estes) e biológicas (teor de matéria orgânica, respiração, biomassa de carbono, biomassa de nitrogênio, taxa de colonização e espécies de microrganismos).

Um bom manejo do solo é aquele que propicia boa produtividade no tempo presente e que, também, possibilita a manutenção de sua fertilidade, garantindo a produção agrícola no futuro. Entre os fatores a considerar na escolha do sistema de manejo do solo em um vinhedo estão a conservação ou o aumento do teor e qualidade da matéria orgânica, a proteção do solo contra o impacto das gotas de chuva e a economia da água nele armazenada.

A matéria orgânica ou húmus do solo, desempenha papel fundamental para as plantas e para o solo: atua como um cimento que faz a união entre as partículas de solo, formando os agregados. Estes são importantes porque tornam o solo mais poroso, melhorando e aumentando a infiltração da água da chuva e da irrigação no perfil, e consequentemente, reduzindo a quantidade da água que vai com a enxurrada. Os agregados estáveis também aumentam a resistência do solo ao impacto das gotas de chuva. Como resultado, ele estará mais resistente aos processos erosivos. A matéria orgânica é importante, também, para aumentar a capacidade de troca catiônica (CTC), que é a capacidade que o solo tem de armazenar nutrientes para as plantas, tais como: cálcio, potássio e magnésio. Além disso, a matéria orgânica é capaz de fornecer nitrogênio, fósforo e enxofre para a nutrição das plantas.

Características dos solos cultivados com videira no Submédio do Vale do São Francisco

Os solos mais cultivados nesta região, em regime de irrigação, são os Latossolos e os Argissolos, que apresentam textura arenosa nos horizontes superficiais, com acidez moderada, baixa CTC e pobres em fósforo; os Luvissolos, de textura média, moderadamente ácidos ou neutros, com valores de CTC e de P médios, e os Vertissolos, de textura argilosa, pH alcalino, com alta CTC e pobres em fósforo quando sob a vegetação natural (Caatinga). Com o avanço da tecnologia para a aplicação e uso eficiente de água e nutrientes, os Neossolos, também, foram incorporados ao sistema produtivo da videira, porém, todos os solos têm como característica comum, o baixo teor de matéria orgânica.

Estudos realizados no Submédio do Vale do São Francisco mostram que houve aumento nos teores de Ca (25% a 400%), Mg (28% a 114%) e P (1.500% a 4.500%) e nos valores de pH (17% a 37%) e V (33% a 116%) nas camadas de 0-10cm, 10-20cm e 20-40cm de profundidade solo em áreas cultivadas com videira em relação aos do solo sob vegetação nativa, em decorrência das aplicações de calcário e fertilizantes. Os teores de matéria orgânica aumentaram, até 40 cm de profundidade, de 16 a 41% cultivado com a videira orgânica, onde também, ocorreram aumentos de 14% para CTC e 12% para o teor de K trocável na camada de 0-10 cm de profundidade. No cultivo convencional da videira, o valor de K trocável aumentou de 8% a 29% nas três camadas do solo. Também se observaram aumentos nos valores da condutividade elétrica (CE) do estrato de saturação, nas profunidades de 0-10cm e 10-20cm dos solos cultivados, que são atribuídos ao acúmulo de sais solúveis provenientes das adubações. Na camada de 0-10cm dos solos cultivados, também se observa um decréscimo nos valores da densidade global do solo (Ds), que deve estar associado ao aumento no teor de matéria orgânica.

 

Conservação do solo

A conservação do solo é uma prática que não é muito usada no cultivo da videira. A resistência à adoção de práticas conservacionistas é atribuída às dificuldades que surgem por ocasião da instalação das latadas e espaldeiras, acompanhando o contorno do terreno, exigindo o emprego de práticas como: plantio em nível e terraceamentos. No Submédio do Vale do São Francisco, devido ao seu relevo plano, estas práticas não têm sido adotadas.

Porém, a discussão de aspectos do manejo de solo nesta cultura é maior do que enfatizar as alterações de ordem química, física ou biológica. É necessário, a partir de uma visão sistêmica, integrar o sistema produtivo ao ambiente e verificar as ações e reações, integrando aspectos econômicos, sociais e ambientais. Neste sentido, práticas conservacionistas como a utilização de adubos verdes, compostos, biofertilizantes, manejo adequado dos restos de poda são alternativas que podem viabilizar a sustentabilidade do sistema de produção da videira.

Nutrição e adubação verde

A utilização de plantas intercalares, como adubos verdes, na cultura da videira, possibilita a obtenção de altas quantidades de resíduos orgânicos, o que permite o aumento do teor de carbono do solo e da CTC, bem como a redução da lixiviação de cátions e água. Por outro lado, a produção de material vegetal "in situ" e a sua utilização como cobertura morta, diminui a evaporação da água aplicada, minimizando os riscos de salinização das áreas cultivadas.

Em regra, qualquer espécie vegetal pode ser utilizada como adubo verde. Porém, considerando as características desejadas, algumas espécies devem ser prioritárias para integrar um sistema de produção que inclua a Nutrição e Adubação verde, destacando-se as seguintes características :

  • Ter sistema radicular profundo para facilitar a reciclagem dos nutrientes.

  • Ter elevada produção de massa seca, tanto da parte aérea quanto da radicular.

  • Ter alta velocidade de crescimento e de cobertura do solo.

  • Ser agressiva e rústica.

  • Possuir baixo custo de sementes.

  • Apresentar facilidade na produção de sementes.

  • Possuir, preferencialmente, efeitos alelopáticos e/ou supressores em relação às plantas não cultivadas.

Além da quantidade de matéria seca, avalia-se também, a qualidade desta, ou seja, sua capacidade em permanecer protegendo o solo e suprindo de nutrientes a cultura principal (videira).

Foto: Vanderlise Giongo Petrere.
 
Figura 1. Manejo de plantas na entrelinha da videira.
 

Uma alternativa compreende o uso de adubos verdes na forma de coquetéis vegetais. O coquetel vegetal consiste no plantio de uma mistura de sementes de várias espécies e famílias, incluindo, leguminosas, gramíneas, oleaginosas, entre outras, com o objetivo de promover melhorias nas características químicas, físicas e biológicas do solo. As seguintes espécies, em diferentes proporções foram testadas e apresentaram um bom desenvolvimento no Submédio do Vale do São Francisco: leguminosas: Calopogônio (Calopogonium mucunoide), Crotalaria juncea, Crotalaria spectabilis, feijão de porco (Canavalia ensiformes), guandu (Cajanus cajan L.), lab-lab (Dolichos lablab L.), mucuna preta (Mucuna aterrina), mucuna cinza (Mucuna conchinchinensis); não-leguminosas: gergelim (Sesamum indicum L.), girassol (Chrysantemum peruviamum), mamona (Ricinus communis L.), milheto (Penissetum americanum L.) e sorgo (Sorghum vulgare Pers.). O fato das espécies fornecedoras de material orgânico serem plantadas em coquetel proporciona, ainda, uma melhor exploração do solo, reciclando os nutrientes de forma mais eficiente que o monocultivo, favorecendo, assim, à diversificação de espécies no sistema de produção (incluindo o aumento e diversificação da população microbiana presente na rizosfera) e, fornecendo material orgânico com composição de nutrientes mais diversificada.

Aplicação de compostos orgânicos e biofertilizantes

Outra alternativa que pode ser utilizada no cultivo de videira é a aplicação de composto orgânico (Figura 2). A compostagem é um processo biológico de transformação do material orgânico, biodegradável, em matéria orgânica humificada ou estabilizada. É uma técnica idealizada para se obter mais rapidamente, e em melhores condições, a desejada estabilização da matéria orgânica. A compostagem é um processo de digestão aeróbica do material orgânico por microrganismos em condições favoráveis de temperatura, umidade, aeração e pH. A eficiência do processo baseia-se na perfeita interação desses fatores. Há uma oportunidade de utilizar os restos da poda da videira para aumentar a taxa de retorno de nutrientes e aumentar o seu teor de matéria orgânica. O processo de compostagem, também, pode garantir a eliminação das fontes de inócuos e de patógenos.

Foto: Carlos Abílio
 
Figura 2. Elaboração da pilha de composto.
 

No processo de compostagem a relação Carbono/Nitrogênio (C/N) inicial ideal é de 25-35:1 e pode ser atingida por meio do uso aproximado de 75% de restos vegetais variados e 25% de esterco. Esses resíduos, vegetais e animais, são dispostos em camadas alternadas, formando uma leira ou monte de dimensões e formatos variados. O composto orgânico altera as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo, fornecendo nutrientes e carbono mais estabilizado. Como o composto pode ser feito com diferentes matérias primas, após estabilizado, deve-se fazer uma análise química, utilizando como extratores água e ácido, e assim determinar as concentrações de nutrientes prontamente e potencialmente disponíveis.

O emprego de biofertilizantes em substituição aos agroquímicos vem crescendo em todo o País e tem contribuído para o aumento da produtividade com a diminuição de custo e controle de pragas e doenças das plantas. Na literatura já se encontram alguns resultados positivos da aplicação de biofertilizantes no semiárido tropical brasileiro para diferentes culturas, bem como no controle de pragas e doenças, na decomposição de matéria orgânica com elevada relação C/N, na melhoria das características físicas, químicas e biológicas do solo e no baixo custo de seu uso. Em síntese, os biofertilizantes recomendados são adubos orgânicos líquidos, produzidos a partir da fermentação de esterco fresco, sem a presença de ar, ou pode ser um produto da fermentação aeróbica de substratos orgânicos.

As técnicas de manejo devem ser incorporadas ao sistema de produção da videira de acordo com o nível tecnológico empregado, considerando os aspectos relacionados aos genótipos, as características edafoambientais, econômicas e os sistemas de certificação da qualidade como produção integrada, global gap, etc.

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